terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Insurretos do eu























SÚPLICAS


Cansada aquela esquelética carcaça
Se adentra sem júbilo no mundo cão
À espera da doce meretriz amada
Castigada por uma vida sem razão

Não suportando a longa vigília na escada,
Enlameada pelas botas do pagador
Só sente a angústia que muito a maltrata
Só resiste pela grandeza de seu amor

Esbraveja pela crueldade do destino
Que dilacera cobiças em desatino
Que lhe veio infligir a hercúlea tarefa

São indagações à sua límpida consciência
Em súplicas de desespero na ausência
No suportar d’ uma vida que detesta

A PAREDE
Sobre o mito de Píramo e Tisbe

Que suspiros são esses,
Que gemem dessa parede malsã ?
Desde que Febo nos deixou
Em seu carro indomável de fogo,
A angústia não mais findou.
É Tisbe se lastimando
Para seu amado, Píramo,
Que no outro canto,
Não vê a luz de seu amor.
Ó Barreira ingrata!
Escudo da desilusão!
Por que não barraste as setas,
Que Eros, certeiramente, desferiu?
Que maculou o destino,
E fez nascer nessa terra
Uma paixão de instinto,
Que em tragédia acabou...


MACAMBIRA
Sobre a macambira de raposa


Limpidez no céu da eterna esperança
Pedras escaldantes no calor doído
Em dias que se alongam num bastar sofrido
Uma saga desprovida de liderança

A mãe natureza, uma madrasta insana
No altar, sorri e mostra face real
Não açoita num desejo vil e brutal
Apenas cintila a imperfeição humana

E quando os nobres cáctus caem em aflição
Vem a raposa solitária e precavida
Cheirando o néctar aquoso da macambira
Santo amado em terras de inanição

A astúcia anima o idílio da investida
Que se acanha c’a inóspita indulgência
De homens inoperantes em sua ciência
Na nebulosa questão que mais intriga


ULTIMATO


Na surdina, cria-se um ultimato
Escrito em linhas fidalgas de ouro
Com a previdência de um urbano recado
Endereçado aos reles valores torvos

Intenso é o prazer pelo ar saudoso,
Teatros inflados se insurgirão
Expelidos de um dom caprichoso
Lustrando o belo e sua variação

Até a ânsia opressora se escassa
No reino sombroso e sem estética
Findando o ritual de despir carcaça
Nos ares gloriosos da ventania ética!


SEMENTE


A semente viva não floresce
Num terreno chovido e fértil!
É o sinal de desânimo na prece
Nos lobos de um cérebro estéril.

O plantador desiludido chora a perda
Não da plantação, mas do fruto prometido...
É a desilusão da demora na alameda
No coração enganado e mui entristecido

Não fertilizou com o sempre singelo amor
As terras de enlevo das mentes emergidas
Apenas cintilou uma luz de dissabor

Capitaneando naus por entre mares
Bravios, pelas muitas fugas da vida
Complacente com o ardor dos lugares.



VERBO SOFISTA


Um espírito enfastiado e aflito se míngua
Num recôndito sob a linha do equador,
Morta-cor resistindo por não ser extinta
Clamando-se por um verbo motivador!

Perigos quase escondidos no sofismo,
A palavra donde se enxerga a vaidade
Os galhos frondosos, traços do caudilho
Último recurso da tenra irmandade

Filhos nus da torrencial trajetória,
Castrados na ascensão da iniqüidade
E definhando em sua fé decisória

Mas, há os privilégios nas isenções
Que exaurem tesouros em desigualdade
E garimpam benesses por ilações!


CONSELHOS


Onde te vi?
Não sei, Não sei...
Mas te senti!
Talvez, Talvez

Quem és tu?
Persiste, persiste
Revoa urubu
Canteiros tristes!

Um floral,
Ausência de ardor
Foges ao quintal
É o terror, o terror!

Não me aflige, matador.
Como vives sem pensar?
Refletir é minha dor...
Pior é vegetar!

Ah! Se pudesses?
O quê?... Esquisitice!
Paciência, não esmorece!
Vagar na psique!

Onde chegarei?
Nos horizontes!
Que vantagem terei?
Aos montes, aos montes!

Não entendo!
Me entenderás!
A contento!
Então, viverás!


VEIO LIBERTÁRIO


Amanhecer por entre os lírios
Permutas nas vãs desilusões...
Anoitecer vagando em ludíbrios,
Anseios marginais de aptidões!

Os vasilhames no todo se quebram
A raiva no afã de ser entronada!
Focos, no desfecho, se dilaceram
Oferendas de máscara escrava!

Urgem libertários d’uma vida
No peito, o calor se formando
Na glória da opção escolhida
Ilustres cálices do arcanjo

Acordando, enquanto é permitido
Ou aprofundar, no pífio devaneio ?
No desejo dum saber entendido
Ajustando-se a seu oportuno veio!


TEUS LÁBIOS


Águas límpidas na fonte jorrante...
Lábios adocicados que se tocam
Sensação indescritível no instante,
Em que enrijecidos corações choram!

São olhadelas varrendo o crânio
Emoções de Náiades irrefreáveis
Apalpares sublimando o encanto
Em suspiros incomunicáveis

Vazantes de sensível esbaldar
Nas viagens de gotas d’água labiais,
Caprichos sensuais rogando ao luar
Nos mistérios de escolhidas vestais!

Odor sublime em amores emergentes
Em suaves cheiros de peles naturais
Arremesso de carícias se sentem
Na cantiga insinuante de como estais!?


FARDO DE UMA MOÇA


Calor gélido vagando no frio
Em nuanças que se escondem da verdade...
O vigilante arquétipo do arrepio
Em cantos dionisíacos de saudade...

Recalques de autoritárias tutoras
Extraindo, dos soltos tirsos, os pâmpanos
E que assombram as ingratas pretoras
Num vôo livre de sonhos e enganos

Acanhado mel em nunca ver
Pobre donzela triste de outrora!
Sem a filha essencial de “Psiquê”
Eis a pura timidez da aurora!

É o cárcere louco de não ser,
Íngremes muralhas amolecem!
Esperando um toque de viver
Nos desejos que mais enternecem !


PERFÍDIA DO EU


Cansaços interinos em massa
Tristezas incertas em clareiras...
Erguimentos de mil asperezas
E o olhar sereno que não passa

Exaurir a inesgotável energia
Balbuciando o mórbido desengano
Rabiscos de um hialino canto(insano)
No ovacionar de manhosa apatia

Vivificar essa abjeta alergia!
Fecundando a tenebrosa perfídia
No instigar da insídia para o eu!

Defenestrar tão insólitos momentos,
Sepultando os maus sentimentos
Na libertação, rumo ao apogeu!


CURA POÉTICA


No estopim faceiro da cega veia cerebral
O campo de fertilidade se desfazia...
Num surto de voracidade descomunal
Minando a raiz, para calar a poesia!

No primeiro choque de escura agonia
Um transeunte viu o sinistro final...
A ciência sem amor nem heresia,
Rendeu-se à sutileza do anormal!

O violão na trilha do último descanso
Reanimou-se, acionando os neurônios...
Rebelião contra o destino, sem ranço
Divina força da fé em Deuteronômio

Uma aurora como nunca se viu
Lampejos de inesgotável sublimação.
E a macabra figura, enfim, desistiu
Naquele ser de honorífica paixão!

E a Serra majestosa do dileto ninho
Se embebeu de arte sob a névoa do luar...
E de alvos florais no enlevo do caminho
Em versos imortais do poeta popular

EXÍLIO


Vendo-te ó bela e eterna amada,
Me escondo das loucas sensações
Que reclamam da situação instaurada
De não poder beijar-te à exaustão!

E tu vontade malvada! Não me consome!
Arranca essa rosa, enraizada no meu coração,
Raiz profunda que maltrata em teu nome,
Pois me faz lembrar o furor de tua paixão

Destino injusto, o que me impuseste?
Viver esse dilema...padecer nesse martírio
Não te amar na canção das ondas à boreste
Apenas sonhar, nesse doloroso exílio


NATIMORTA


Ansiedade corriqueira e invasiva
Nas razões de minha insurreta mente,
Na chegada da primeira nascente
Espanto com a vegetação furtiva

Olhando por entre nuvens calmas
Capturando imagens perdidas,
Percebendo as antigas feridas,
No lerdo regresso às verdes palmas!

Mas onde estaria o povo dessa terra ?
O silêncio retorquiu em ironia;
E penoso rastro que encerra ?
O êxodo respondeu com alegria.

Natureza impiedosa, esclarece?
Por que tanto cultuas o desperdício?
Desprezando os acordos no armistício!
No devorar, na luta que entristece!

Restou o sopro dos calores escaldantes
Inimigo voraz dos resquícios de água
O comparsa das irresistíveis mágoas,
Em ecos que delatam a aridez do antes!


FULGOR


Vestes salientes
Vestidos queimados
Caldeiras “calientes”
Em simples afagos (apenas mostrados)

Moças carnudas,
Vontade arguta!
Seios, pernas desnudas
Que não se desfruta!

Vilipêndios de castidade,
Certeiras investidas...
Adeus à santidade!

Na beira do indefinido!
Capadócios corriqueiros...
Sentimento enaltecido!


SENZALAS


Nos espaços dum calvário citadino,
Imensa é a exposição do espírito...
Crueldade, flertando com o conformismo
Êxtase que se ausenta ao paladino!

São versículos de uma carta vigente
Impregnados entre as teias sociais...
Castelos e suas senzalas marginais
Vastos sinais que insuflam ao demente

Restrição ao leque de decisões
Ensejo do teorema, feiticeiro,
E a desconfiança nas orações!

Sôa otempo de invasão encampada,
Panfletos voam em dardo certeiro,
E a cônscia paciência esfacelada!


SERVIDÃO


A liberdade, bem precioso,
Perde sua onisciência,
No surgir da dependência,
Procriadora contumaz da servidão!
A servidão nua,
Mãe nefanda,
Gera a incoerência
E a calejada humanidade,
Em sua decifrada genética,
Sofre a degradação


CHAGAS ANTIGAS


Fendas soprando ecos endiabrados...
Suspiros nos ouvidos humanais!
Alertas, vindos de tempos passados
Consciente coletivo em matagais

Mascarados oram suas insanidades,
Sementes germinam com ódio descabido
Surgem os conceitos de falsas verdades
Uma nova frota guiada pelo "Cocito"

Viventes estranhamente se Stalinizam
O clã moderno rasteja e se deteriora
Arcaicos mundos tirânicos se eternizam
Sem ver a criança do fado que senta e chora

A luta é contra o extremismo
E as sombras na alcova se escondendo
Nos klans, nas suásticas, no niilismo
De mentes, no mal se envolvendo!


ANSIEDADE


Insaciável desejo de logo aportar
Em horizontes cada vez mais distantes...
Sonhos de aventureiros viajantes
É a neura de um sólito a se maltratar

Desprezando a tranqüilidade garantida,
Nos instantes das primeiras vitórias!
Sede, mesmo com a fartura auferida
São partes angustiantes das histórias


TEUS SONHOS


Integridade num nascer inusitado
Plantando ações de forte repercussão,
São saudáveis crias do educador engajado
Gloriosas vitórias de nova visão!

Escondidos sem orgulho na caridade,
Em escrituras de meiga sensação...
Os vácuos raptando a indulgência da idade,
No santo caminho da ressurreição!

Os passos no caos formam viva miragem!
Na epístola celestial de libertação...
De muitos, e poderiam ser, em homenagem!
Saudando tuas aventuras de levitação


MÍSERO


Nas artérias de uma malha urbana
Numa tarde neurótica e previsível
Refletindo sobre a sina humana
Se o pacto convosco é flexível?!

Cessar a promessa cativada na infância?!
A catilinária d’um desejo pretérito
Num individualismo cru, sem alternância
No frágil destino do bel-prazer sem mérito!

Eis a utopia cultuando a depressão!
A calma, saboreando o conformismo,
Mudanças de um mundo cão!
Adormecer, talvez o cristianismo?

São dialéticas circunstanciais
No alívio do inconsciente festivo
Prazeres no ânimo do não mais
É o mundano argumento do cativo!


ALÍVIO


Restou ínfimo fôlego
O abandono foi cruel
Exauriu-se até o sopro
No estado de desespero,
Na ausência do mel.
Mas por que não sublimar?
Esta tua inefável dor
Como numa lírica melodia
Que tanto te marcou ?
Que tanto te angustia?...
E, as lágrimas escorrem
Num pranto acre
Que podem já à tarde,
Encharcar a sequidão,
Lavar o teu sôfrego...
E aliviar teu coração!


ACERTOS


Há anos-luz das efêmeras ações
Existe uma morada na montanha
Labor de doloridas cauterizações
Mágoa da putrefata entranha

De lá, ouvem-se sons intrigantes,
Esses são os acertos espirituais
Parecem animais ressonantes
Pois ecoam em vozes carnais

O prisma macabro da resistência
A indolência dos seguidores de Plutão
Que se esbaldam sem penitência
E se acomodam na desolação !?

São crepúsculos da lerda escuridão
Curvando-se para as auras novas
Arrumam-se na sabedoria da solidão
E irrompem ao sublime frio das horas

São ânimos da antes natimorta afeição
Na casa aconchegante da consciência
Sem máculas, vícios, nem ilusão
No exalar do amor em cruel ausência


ANOITECER


Não posso te repreender
Se minha impaciência,
Quiser te desmerecer!
Pois teimosos foram em tua demência
Comparsas foram de tuas fraquezas.
E se o instinto fosse escravo da razão de Plutarco,
Não terias pulso para manter as incertezas,
Nem espargir as mudanças no frondoso arco!
Imploraste clemência às portas fechadas
Foram cruéis e surdos os corações
Desviaram-se da tristeza de tuas humilhações
Pois sabiam que escutá-las,
Seria, talvez, saná-las...
Mesmo falseada, da insensata frieza!
No forjar do compromisso com tua recuperação.
São íntimos se a vela da nau soprar
Mas estranhos, quando o vento esmorecer
São os Lordes do gesto singular
Sempre ausentes em teu anoitecer.


AMANTE OCULTA


Carinhos elegantes em tocares...
Hermenêutica ilógica de lugares,
Inconformação na trégua dos vulcões
Alternância de salivas e insinuações
Rasgada a indumentária, flamejante
Amores inesquecíveis, dor suspirante

Marcas em recantos sugestivos
Arroubos de amores e puxares compulsivos
Harpas tocadas por anjos invisíveis
Assistindo aos sons mudos e ouvindo os devassos
Tatear o ventre e montes dourados
Musa despertada no prazer incomensurável
Afrodite, senhora, na volúpia insustentável

Madona de relva fecundante
Lucidez, ingrata, na cena efervescente
Urgem palavras do inconsciente
Camena, a rainha, a cortesã e o harém de um só
E os pretores num rubor que dava dó
Nau desperta balanços dionisíacos
Aurora excelsa nos lençóis afrodisíacos

Alienígena de falas doces e marcantes
Guirlanda de sonhos rejuvenescedores
Recipiente de cortejos rejubilantes
Anuncia-te, ó deusa., de meus eternos amores...!




TEMPOS E SAUDADES


Invasão em espasmos de sentimentos
Tardes entediadas duma primavera
Ardor nervural em vias de desalentos
Desatinando-se em tudo que te espera

Desviar-se da mágoa que incensa
Postura de uma esperança ilusória
Na tentativa de fugir da intransigência
Da maestria de emoção peremptória

Nos suspiros trancados na castidade
Catedrais da tua curta memória...!
Resquícios da envelhecida felicidade!

Encarar essa pífia destreza humana!
Fagulhas saudosas são parte da estória,
No tempo construtor de teu nirvana


AMIZADE


Anima essa divina flor!
É ela que te alimenta
Te dá luz e amor
Te enleva e te acalenta

Não a deixes padecer...
Belas pétalas a borrifar
Adora-a a todo anoitecer!
Ama-a a cada novo raiar!

Seu desabrochar te alivia
Límpidas cores são tua guia
É a beleza a se expressar

O pranto amacia
A saudade se esvazia
E a solidão a desprezar


DORES


Sombrios cutucares vespertinos
Pulsares ocultos nas reentrâncias
Mefítica em hércules e meninos
Malogros carnais de circunstâncias

O calor gélido nasce nos poros
A agudeza afasta a monotonia
Reacendendo os sonhos mais simplórios
Na masculinidade e sua agonia

Ó nobre majestade das agruras!
É capcioso teu “modus operandi”
E quando mortais se doam às aventuras :

Denuncia-os nas orgânicas judicaturas,
Sem o perdão a estratagema se expande
Restando o apelo aos crédulos, nas alturas!


MANGAS DE JASMIM
Uma homenagem a lenda das “Mangas de Jasmim de Itamaracá”,
contada por Câmara Cascudo


O homem de nome Albuquerque
Por Dona Sancha se apaixonou
O Engenho Andirobeira que negue!
Mas era o mais sublime amor

Entristecido se fez lutador
O herói da Capitania brava
Em fugas para superar a dor
Chorando fardos de sua vida casta

A amada que suportou a espera
No doce crendice de revê-lo
Se embebedando na fonte eterna
Do desejo oculto de uma dia tê-lo

Retornando como humilde Padre
E um corpo de súbito padeceu
O coração foi plantado por Aires
Num sepulcro que logo floresceu

Deu frutos de meigo adocicar
Nascidos no mais tenro jardim
Herança cativada no amar
As frondosas mangas de Jasmim


MEDO DE MORRER


As armaduras de meu eu se despedaçam
Cruéis presságios enriquecem na ansiedade
As viagens em mares de crânios que se enlaçam
Gritam sons das trombetas da mortalidade

Sonhos c’o futuro pedem o último perdão
Em rima, ao mandatário dos Alpes celestiais
A musculatura da petulância que é em vão
Nas horas de vislumbre de esquifes e metais

No derradeiro senso, estão os corajosos
Escondidos na timidez dos sentimentos
De uma carne que rejeita o ceifo mortal!

Homens, covardes e incrédulos, ardilosos,
Desmascaram-se na porta do firmamento
Arrependidos ante o desespero final!

CARNE/ALMA

Ó paraninfa dessa curta jornada!
Como estás na tua infinita vida?
E como podes agüentar ser tão amada,
Para depois, logo depois ser ferida?

Por aí dizem que és toda invisível,
Injustos homens pensam assim
Não sentem a presença irresistível
Submissos, como ao rei, o Mandarim?!

Alegram-me esquecendo-se de ti
Disparate filosófico do pensar
Do evoluir, deveriam, todos, louvar-te
Pois no tempo, enfim, a matéria cansará

Já tu tens a eternidade a sublimar
Teu agraciar, um ícone do nobre anseio
A beleza, uma divindade a cultuar
Num mundo voraz de tanto devaneio


OUVIDOS ÁVIDOS


Mistérios banais nas réstias daquele meio,
O encalço surdo às verdades intragáveis...
Famintos, odientos no sofrimento alheio...
Ávidos, os curiosos por boatos insondáveis!

O espalhar do ruim superando os amáveis
Em interesses vis d’uma torva vontade
Esmagando alívio incomensuráveis,
No anseio de adorar o cínico covarde,

Perigos iminentes a fragilidade disfarça
Vesúvios de uma Pompéia quase inocente
Derretendo-se nas larvas da trapaça

Na confiança cega sempre alheia ao desatino
Tateando o ar na certeza do que sente
Perdidos no tempo sem ter um destino


PAPIRO TELÚRICO


Na flora enigmática de ilusões!
Lia-se doce expressão de sentimentos
Por entre as rosas dos jardins dos panteões
Impressa num papiro de encantamentos

Escrito por suaves mãos apaixonadas
À princesa dos reinos escondidos
Inspirado na grandeza de paixões incontroladas
Mas, a dura realidade os deixa impedidos

São passos num cotidiano de paciência
Afinado ao contador incansável dos tempos,
Que aguarda o sonhado olhar de anuência
Nos imbróglios dos cheiros e dos contratempos

Acalenta-o e que ele não te destrua
Pois clamas um colo que te esbanja
Apalpas a pele que poderia mas não é tua
Escaras o fato desse amor que debanda


PROSÉLITOS


Flagrante situação de desconforto vivida
Em um reino rico de tanta investida
Onde homens destemidos e cruéis
Se afastam, deixando somente às ralés
Assumirem os ditames de uma nação

São plenárias entediantes de prosélitos
Que só usam de quantos despautérios
Em causas escusas e sem decência
No clamor dos que não pedem audiência
No estorno dos sonhos de uma nação

A arrogância do argumento sem profundeza
Que vomita a tese num falso espelho de certeza
E eleva o cajado, tocando-o na suja inverdade
Sem espírito público, misturando-se à maldade,
Num subterfúgio ludibriante ao povo desta nação

Sem auscultar a mandante maior, a consciência
E manobrando nas sombras da sua indecência
O homem desvirtua uma dádiva que é sua
Que lhe foi outorgada pela soberania nua
Cansando exaustivamente o povo dessa nação


FOTOSSÍNTESE


Dança, bela tulipa e na euforia
Empina tua resplandecente alma
Soergue a estampa de tua galhardia
No Karma intrigante de tua calma

Tua fotossíntese é feita pelo amor
Teu banho é de gotas de perfumes
Tua raiz se abraça com o louvor
E tua beleza espanta os queixumes

Estróina de carinhos, te acolho
Encobri-me com esse corpanzil
Usurária de instante caprichoso

Pois esperava por isso, não minto
No indefinido cosmo de azul anil
Ungido no ápice desse amor hialino




No entender de uma razão espiritual
O homem sempre se trai nas evasivas,
Festejando nascimentos e partidas
Uma contagem de fulcro fenomenal

É a sombra incômoda da desesperança
Que recai na mente que se vê perdida
Não encontrando firme lastro em sua ida
Nem um ombro amigo em sua andança

Agarra-se à fé em desespero
Mas pelo medo, não pelo límpido apego
Que decepciona a muitos e a si mesmo

É o despreparo para o encontro divino
Que se compôs na calmaria do instinto
Que se desfaz na incerteza do destino


MENINA MEIGA
À linda Thaís


A sublimidade de seu ser
É um manto de afeição
Um olhar de amanhecer
Um sorriso do coração

É nessa menina da Bahia
A inocência que mais sinto
A adolescência em euforia
A meiga flor do Olimpo

Os pássaros a saúdam
Em cânticos romanescos
As exaltações se juntam
Em ramagens e afrescos

Pois do mel tem a doçura
E cativa pela raiz
Jovem Madona da ternura
De belo nome, Thaís

DIGNIDADE


Escavacando o baú dum velho honrado
No decifrar de rica e fecunda travessia
Encontraram-se manuscritos e tratados
Um terço, lenços caducos e uma alforria

Espalhados sem ordem na cama do erudito
Mistura indecifrável de achados e perdidos

A ojeriza reinava na maestria intrigante
E as células de todo se confundiam
Digladiavam na arena ordeira e reinante
Sem conciliar os “causos” que ouviam.

Senso humano que nunca é deveras isento
Na mácula de preconceitos e ideologias

Justificar um sol que os males desmerecia
Que acendia escuros de sôfregos e desilusões
Que encantava por suas crônicas e poesia
Febéia no delatar de injustiças e imperfeições

Era a codificação genética de uma diversidade
Em lembranças póstumas da dignidade



CARNAVAIS


São festas pagãs numa ordem profana
Pobres espíritos nus em euforia
Cantarolando a regra mais insana
Adeus às tristezas, eis a alegria!

O éden de verdes folhas nas vergonhas
Interesses sujos se espantam
Lábios retorcidos por entre fronhas
O temor c'as ovelhas que debandam

Inquisitórias visões se repelem!
Longínquas vontades em exercício,
Nas antologias que nunca se perdem

Ó! deus pagão de intuições altivas
És psiquiatra d’almas em suplício
Pois despertas as vontades indecisas!




















ATALANTA


O cimo do vigor físico,
Em Atalanta, a pobre donzela
Exalando aos ventos
Inebriantes perfumes naturais,
Um corpo tão desejado,
Escondendo um destino ingrato,
Num disfarce sensual.
Corridas adornadas,
De invisíveis sentimentos
E um semblante empalidecido.
Coragem embebida de paixão
O desafiante amado,
O belo Hipômenes, o juiz,
Na disputa do amor incurável.
Arreigo na árvore celestial
Maçãs de ouro da deusa vaidosa
As artimanhas da conquista,
Uma carga espinhosa.
O oráculo não se enganou
A vingança dos céus da Tessália
Nos punhos fortes de Cibele,
Que ao tempo se confirmou.
A paixão que nasceu ingrata
E no calor malograda,
Ficando os pobres amantes
Atados num carro, tal feras
À mercê de caprichos errantes.


PODER


Na sede de beber o sumo do poder
O homem se falseia em louca maquiagem
Intrépida razão vagando no entender
Remate inóspito se encurta na passagem

Cultivos de ervas daninhas em antevisões
Amplas planícies esburacadas e sem ética
Aldeões impuros se inibem nas malversações
E farejam suspeitas, em sina profética!

Situação de acordo e teleológico conchavo
O mal se esbaldando em ganhar novas posições
E o bem ente poderoso, mas supra-acanhado

Pois um príncipe descasado de pureza
Que arejaria a putrefata carnificina
Não pleiteia resquícios em atos de nobreza


RENASCER


Poeiras que moram num alquebrado coração
No velho sofrimento, seu antigo companheiro
Louco abandono que se deu no auge da doação
Exaurindo a fragrância, do nobre cancioneiro

Ó bondosa compaixão, clamas por um asseio!
Arrancando a capa inexpugnável da solidão
Aclarando as veredas e ofertando esteio
E a vida, no pulsar compulsivo da emoção

Liberto, sentirá o frescor no sopro primeiro
Que foi usurpado sem a impaciente relutância
E preso na rude violência do carcereiro

Agora, a aparência em fantasia
Na avidez por ir voar em nuvem cândida
Pedindo clemência pra sua utopia


PREMONIÇÃO


Deuses desacreditam tuas mensagens irreverentes
Menosprezando a essência do zen, tal pobre ignoto
Relutando em aceitar os suspiros que fluem da mente
Numa capa oca, esfarelada, neste teu inerte corpo.

Transcendem fatos mórbidos, um de cada vez
Em alucinógenas misturas, na veracidade esguia,
Cognições libertas em panos escuros sem altivez
Tristes avisos, se entendidos, tudo cessaria!...

DROGAS


Dilúvio vascular que deságua
Devorando evoluções distantes
Disfarçando os seus alívios n'alma
Sepultando aos berros os infantes

Angustiante cantiga de lamentos
Amantes de uma sociedade sã
Na ruína da sanidade aos ventos
Pragas comendo carne temporã

Vendedores de morte por prazer
Milícias de uma guerra sem decência
Violências imerecidas de ser

Ofuscando o verdadeiro labirinto
Escondido no manto da complacência
Tristes mazelas de um sistema faminto


TIRANA


Sempre ele disse
Não que mentisse
Somente não sabia
O que o tempo fazia

Hoje se envergonha
De vê-la em sonho
Cobrando os discursos
Esses, um expurgo!

São ambições
Calcadas em soluções
No amparo da flexibilidade
Alheio à dignidade

Se não fosse a tirana
Moradora do Nirvana
Que na noite o cutuca
E tanto o perturba.

É a consciência perversa
Que não morre depressa!
E não abandona o momento,
Nem o exime do sofrimento.


LÁGRIMAS


Que ciclo de fervura certeiro
Ultrajando essas míseras almas
No limiar da morte do marmeleiro
Para depois encharcá-las d’água

São terras de tanta decrepitude
Ignoto lavrador sem o pincel
Que pinte o verdume na longitude
E renasçam nas lágrimas do céu

O espanto sempre advém na agrura
Por que não pensar como Nabateus?
Empreendendo as ações na fartura
Preparando-se pra o ócio de Deus


LIBERDADE

Vem, meu louco amor!
Abraça-me, abraça-me!
Torna essa oferenda,
De tua doce alma
De tua delirante carne
O portal dos sonhos.
Que me levará
Aos imaginosos paraísos
Da sublimação, do enlevo,
Do sentido transcendental,
Do suspiro na crença,
Do que é eterno.
Onde os cheiros,
Os ventos da aura,
Os cânticos dos corações
Impõem mais respeito
Mais credibilidade
Que as mil letras,
Que as mil falações.
Dominante sem grilhões,
Governante da harmonia,
Inimigo das censuras
Partidário do encanto.
Quem ama,
Não apenas consente
Não apenas perdoa
Mas, sobretudo
Liberta....

FUGA DA VERDADE
Quando um amigo se esconde da verdade


Vi-o!
Entendo
Confins
És lento...

Se tu podes ?
Cativeiro
As estrofes
Não te vejo...

É límpido...
Se queres?
Instinto
Casebre...

No tempo
Verás?
Intento
O cerne....

LIDE POÉTICA
(RAZÃO/EMOÇÃO)


No debate da vida, a razão toda imponente
Pergunta a sua suposta fraqueza, à emoção
Donde vem seu argumento e sua persuasão,
Na tentativa de exaurir com os entrementes

A emoção mui passional, como lhe é normal
Suspira, no seu rubor, e se lança na discussão
Não aceita a maquiavélica insinuação
Não recua defronte à calculista boçal

A razão sorri, na prevista e cínica quietude...
E diz com sua frieza: “Não te perturbas!,
Ó! encantadora, eis o estado que lutes!
És impulsiva, isso é um fato, ... me escuta!”

“Achas incauto, ó razão, o divino sentimento do belo?
Longe de tua razão, os imensuráveis amores
E a subjetividade da fragrância das flores?...
Queres dissecá-las para criar um libelo?!”

“Como sempre, anseias me emocionar
É o ritual de teu derradeiro livramento
Te escondes na sombra dos desatentos
São flancos, na extinção do compenetrar”

“Raciocinar as retas e métricas do amor?
A frio, indagar o sentido da poesia ?
Ou formar matrizes, mensurar a sinergia?
Parametrizar a fé, a sua arte, e seu louvor?”

“ Querer calcular o amor, ainda não é possível!
Desmascará-lo, evitando o sofrimento!
É a necessidade, é teu único salvamento
Sobre a poesia, mil vezes a inteligível”

“Oxalá haja meios de te convencer
Da beleza expressiva, da res envolvente
Se só vagueias nas trevas da única vertente
Como avançar no inconsciente, pra te entender?!”

Só há diante de exaustiva lide uma solução
Buscar um magistrado de virtude incontestável
Um Saturno de Higino para a dissensão
Uma obra difícil, mas um intento executável

Na árdua busca, o bom senso foi eleito
Os autos, então, estudados em abundância
E os interessados se cercaram de ânsia,
Quando o responsável mor dirimiria o feito

O infinito julgamento, enfim, se iniciou
O bom senso sereno ouviu os argumentos
E entre labirintos de nobres lamentos
Convenceu-se da verdade, do vencedor

Triste, a emoção, pasma, passou a ouvir
Sentença em extenso e erudito memorando
Que lhe retratou, promovendo seu desencanto.
A razão não percebeu o que tinha porvir

O magistrado virou-se para a razão:
“Achas o mundo frio, nobre calculista?
O resumo duma equação mecanicista?”
Era um expressar de elegante irritação!

“O verniz da verdade não está nos radicais
Uma dose de razão, uma pitada de emoção
Ou um cálculo, aliado ao calor do coração
Esse é o equilíbrio, é a forma que satisfaz”

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