quinta-feira, 26 de agosto de 2010

A Virgem Maria e a "feminização" do Ocidente.


Discutiremos nesse texto a perspectiva de crescimento do mito mariano dentro do processo de feminização do ocidente e sob o ponto de vista da crise moral pela qual passa a Igreja Católica.

Percebam o termo “mito” no sentido de narrativas sobre personagens e acontecimentos que apesar de serem, muitas vezes, revestidos com poesias, cores e paixão, não deixam de trazer à tona verdades profundas da humanidade e de suas culturas. Jamais no sentido de inverdade, como queria a modernidade e os "racionais".


Judith


 Por isso, toda sua capacidade de nos envolver, de refletir imagens primordiais, como se o nosso inconsciente (coletivo e individual) sentisse ali um lugar seguro e acolhedor, transmitindo-nos energia psíquica e biológica, ou seja, nos enchendo de emotividade.


A Caixa de Pandora

No caso da Virgem Maria, especialmente, isso nos parece evidente. Sua imagem de proteção, de mãe, de cuidado, de intercessão (pois é isso que pedimos sempre as mães) inunda nosso pensamento, atingindo nossos sentimentos mais profundos.

Essa nos parece ser uma das boas razões para o culto milenar à Virgem Maria se tornar uma poderosa expressão do imaginário coletivo (e não só dos católicos).



Nesse ponto, é bom desde já enfatizarmos que tanto Lutero como Calvino (fundadores do protestantismo) reafirmaram e exaltaram a figura de Maria).

Vejamos Lutero :

“Quem são todas as mulheres, servos, senhores, príncipes, reis, monarcas da Terra comparados com a Virgem Maria que, nascida de descendência real (descendente do rei Davi) é, além disso, Mãe de Deus, a mulher mais sublime da Terra? Ela é, na cristandade inteira, o mais nobre tesouro depois de Cristo, a quem nunca poderemos exaltar bastante (nunca poderemos exaltar o suficiente), a mais nobre imperatriz e rainha, exaltada e bendita acima de toda a nobreza, com sabedoria e santidade."
(Martinho Lutero, "Comentário do Magnificat", cf. escritora evangélica M. Basilea Schlink, revista "Jesus vive e é o Senhor").


The Excommunication of Martin Luther

"Peçamos a Deus que nos faça compreender bem as palavras do Magnificat… Oxalá Cristo nos conceda esta graça por intercessão de sua Santa Mãe! Amém."
(Martinho Lutero, "Comentário do Magnificat").



Por isso, os ataques religiosos (isolados) contra Maria tenderiam mais para um receio patriarcal em não se submeter ao elemento feminino “divinizado”, ou mesmo uma tentativa de diferenciação religiosa; do que uma contra-argumentação teológica consistente.

E falamos o termo divinizado pois é assim que suas representações e crenças parecem sugerir.


Tudo isso, a despeito de buscarmos constatações históricas de sua existência e de seus atributos. Até porque a racionalidade pura e a historiografia mais conservadora não conseguiriam por si só alcançar a plenitude do fenômeno da Virgem Maria.




No fundo, estamos tentando falar, na realidade, de uma espécie de predisposição nata (estrutural) para recepcionar os sinais de Maria, como Arquétipo da Mãe.

E é esse o nosso ponto central.
Ora, se é verdade que o ocidente passa por um “processo de feminização”. E mais: se realmente vivemos uma tentativa da humanidade em se (re) integrar à Mãe Natureza (e não mais subjugá-la), estaríamos raciocinando com base em valores femininos.




Saturam-se os “tempos modernos”, e também sua bandeira de endeusamento da razão. Na pós-modernidade, diferentemente, há uma evidente valorização da emoção, do feminino.
Nesse sentido, figuras como as de Maria tenderiam a adquirir força e capacidade de expansão. Percebam que não se trata de uma questão tão somente de religião.


Nesse sentido, a “imagética mariana” expressa também a capacidade de resistência da mulher ante as mazelas da vida (vejam a vida das mulheres nordestinas: mãe, educadora, trabalhadora). A mãe que se doa inteira e traz consigo a essência da paz de espírito, sem contudo, negar-se a enfrentar a vida.


Por outro lado, sabemos, obviamente, que há um renovado culto a Maria, patrocinado por alguns movimentos católicos, com ênfase nos valores familiares e morais ortodoxos, com rejeição do homossexualismo e do sexo antes do casamento, e nos deveres de assistência caritativa. (Alves, 2002). Mas esse não é o foco de nossa discussão.

Apesar de o entendermos como uma espécie de rememoração com alguns atributos das Madonas da Idade Média as quais expressavam uma imagem de mulher associada à castidade e distante do sexo, dos prazeres. Um perfil conveniente à sociedade patriarcal daquela época, na qual o papel da mulher era restrito ao universo do privado.

Mas esse não é o ponto que nos interessa no momento.


Estamos em busca de demonstrar a força arquetípica de Maria, e toda uma constelação de imagens, em crescimento na pós-modernidade, inclusive associada à imagem da Grande Deusa.



Não é uma discussão teológica. A teologia que inclusive já foi associada à figura de uma mulher. Lembremos Beatriz, de Dante, e em meio ao patriarcalismo severo da Idade Média.



Por outro lado, em meio a essa “crise moral” pela qual passa a Igreja Católica, especialmente em relação às acusações de pedofilia e inflexibilidade do “dominus papal” em aceitar a flexibilização do celibato. Algo que hoje está custando muito caro Igreja.
Outros momentos da história ocidental assistiram ao fortalecimento do culto e simbologias marianas, foram eles, como por exemplo, nos século XI, XVIII.

 Parece-me que estamos na iminência ou já vivenciando um novo evento dessa natureza.

domingo, 1 de agosto de 2010

A "Religião Rastafari" e o "Mito Bob Marley".


Falar em Bob Marley e na religião Rastafari é como marcar um encontro com o “sincretismo religioso" jamaicano.

A mistura de mitos, crenças e culturas é quase uma tatuagem desenhada no corpo dessa bela ilha do mar do caribe. Talvez até mais: as suas diversas cores (religiosas) sejam um dos seus adornos mais interessantes.



Falamos em mistura de religiões, e, nesse sentido, nos reportamos a um mix de influências: seja ela cristã (inclusive do cristianismo ortodoxo), da religião judaica, dos rituais tradicionais africanos, do hinduísmo, e até do islamismo.




Todas elas compondo uma cultura que resistiu bravamente à dominação do puritanismo inglês, não permitindo que se impusesse a religião do colonizador.

Guardando as proporções, o catolicismo trindentino (da época do nosso descobrimento) não teria conseguido transpor integralmente o seu credo à terra brasilis.

Mas exemplifiquemos um pouco essa influência multireligiosa na Jamaica. Pois é a partir dessa perspectiva que podemos entender  melhor traços importantes da cultura e da religião Rastafari.

O nosso primeiro exemplo seria os famosos dread, de influência hinduísta. As tranças-mechas dos rastafaris, hoje muito usadas em todo o mundo, são idênticas "aos cabelos dos saddhus da Índia”.




Nota-se, de outro modo, a existência de congregações rastafari com inclinação para o Cristianismo Ortodoxo as quais adotam mandamentos do Antigo Testamento (judaico).


Muitos Rastas são membros da Igreja Ortodoxa Etíope

Congregações outras prescrevem conduta e indumentária femininas, essas de inspiração muçulmana.

Interessante que nas cerimônias das Igrejas Cristãs Jamaicanas, de orientação Ortodoxa  é muito comum o uso de "performances com tambores que resgatam ritmos africanos" .

É nessa “percussão que estaria a raiz da criação do gênero de música denominado reggae-raiz. Uma música que combina a cadência hipnótica dos tambores com harmonias simples e arranjos que utilizam guitarras e outros instrumentos", com influência do  blues e do rock.


Não poderíamos deixar de falar um pouco da marijuana (a maconha), em particular, do seu uso em rituais religiosos. Algo muito associado ao imaginário dos Rastas e do próprio Bob Marley.


"Marley era um grande defensor da maconha, usada por ele no sentido da comunhão, apesar de que seu uso não ser consenso entre os rastafáris". O uso espiritual da cannabis é mencionado em muitas de suas músicas.
Mas primeiro é importante que se diga: o uso de plantas de efeito alucinógeno em rituais religiosos é muito antigo, seja na Índia, no México, entre os Andinos, Asiáticos e muitos outros.

No Brasil, "a maconha surgiu, trazida pelos escravos da região de Angola. Por isso é também conhecida como Fumo de Angola". "Os negros utilizavam nos rituais religiosos, culturais e para aliviar as dores da alma e do corpo".


Essas plantas, por conterem substâncias capazes de provocar alterações mentais, possivelmente, fizeram com que líderes religiosos acreditassem em sua capacidade de transpor "o sentimento de separação entre o homem e a natureza, entre o homem e Deus, entre o homem e seus ancestrais". 

Obviamente, num sentido um pouco "diverso" do atual consumo de marijuana, pelo menos para a maioria dos consumidores, em especial, nas grandes cidades.

Um bom exemplo dessa afirmação são os Coffe Shops de Amsterdã, nos quais o consumo da maconha é permitido por lei. Nesses a  maioria dos consumidores parecem procurar a marijuana por puro deleite, muito longe de um ritual religioso ou místico.

Mas nos dediquemos ao Mito Bob Marley, uma figura emblemática para a cultura rastafari, especialmente por sua imensa capacidade de divulgação da fé rastafari pelo mundo.

O imaginário em torno de Bob Marley até hoje é cultuado e alimentado pelas gerações que se seguem.


Contemos um pouco dessa história.

Um pastor de nome Marcus Garvey repetia em suas pregações uma profecia que na "África surgiria um Rei negro, o filho do rei Salomão e da rainha de Sabá, que libertaria a raça negra do domínio branco".


Em 1930, "Ras Tafari Makonnen foi coroado Imperador da Etiópia e passou a se chamar Hailè Selassiè". A partir de então, na Jamaica,  passou-se a acreditar na confirmação da profecia. Surgia, então, uma nova religião chamada Rastafari.

E mais: em meio a essa construção cultural, Marcus Garvey estimulou os negros a sentirem orgulho de si mesmos e de sua herança africana. Os Rastas passariam a incorporar uma espécie de orgulho de ser africano. O amor e respeito pelas coisas da África.

  

Nesse termos, o estar próximo a natureza, da  savana africana, de seus leões, se tornarm aspectos primordiais à formação do conceito que eles tinham da essência da cultura africana, aspectos de um imaginário em formação. 




As próprias cores verde, dourado, e vermelho, representativas da bandeira da Etiópia, frequentemente vistas em roupas e decorações, assumiriam um simbologia muito cultuada.


O vermelho representaria o sangue dos mártires, o verde representaria a vegetação da África enquanto o dourado representaria a riqueza e a prosperidade do continente africano.

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Fontes:
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