quinta-feira, 22 de abril de 2010

A sexualidade e o celibato entre os primeiros cristãos e no discurso dos Primeiros Padres


Falaremos um pouco da aversão à sexualidade (e ao prazer) e do celibato, segundo o cristianismo primitivo e o discurso dos Primeiros Padres. Pretendemos, com isso, identificar certos valores inerentes ao cristianismo emergente os quais influenciariam até hoje os nossos costumes e comportamentos, em particular, a nossa moral sexual.


Primeiro é importante que se diga: o cristianismo por se tornar o centro da devoção religiosa ocidental, passou a ser uma fonte geradora de normas morais. Nesse sentido, a noção de sagrado e profano ficou muito “bem definida", sustentando sua teologia e símbolos a respeito do que seria pecado (claro, sob o enfoque da sexualidade).


Tentemos, pois, contar essa história.

O cristianismo surgiu numa região localizada no Oriente médio, e conhecida como Palestina (o país de Canaã). É ali onde, em meio a uma pequena seita judaica, teria nascido Jesus Cristo, o Messias (um descendente da casa do rei Davi).


Importante destacar que, no início, a pregação dos discípulos de Cristo, também chamados de nazarenos, se baseava em três eixos principais: no «igualitarismo, na assistência social a todos (a caridade) e na salvação post-mortem (depois da morte)». Bem, nos ensina o historiador Paul Veyne.

Mas os nazarenos cultivariam, ainda, a preocupação com a austeridade e a repressão à sexualidade, e exaltavam personagens sociais desprezados na Antiguidade, como as «mulheres sem homens, ou seja, as virgens e as viúvas (Odon Vallet).

A força do cristianismo nascente, entretanto, era restrita, poucos adeptos e muitas perseguições. Só a partir da missão de Paulo, e, posteriormente, com a "conversão" (em 312), de Constantino (Imperador Romano), se inicia, realmente, um processo de ascensão e fortalecimento do cristianismo.

Curioso observar que Constantino antes da "conversão" lutava sob a proteção do Sol Invictus (Mitra). O mitraísmo era a religião mais difundida no império romano à época do nascimento do cristianismo. Sua origem data de 2.000 a. C (na Pérsia).


Apesar de algumas semelhanças entre Mitra e Jesus (nasceram de uma virgem, cearam com seus discípulos antes de morrer e ressuscitaram), Mitra é um deus guerreiro. Por isso, talvez, sua popularidade em Roma cuja simbologia se relacionava ao touro, ao sacrifício, ao sangue (não é à toa a paixão dos romanos pela lutas dos gladiadores).

Jesus, ao contrário, trazia a mensagem do amor, era o cordeiro (que se deu em sacrifício), o peixe.

Pois bem. Constantino ao trocar (antes de uma batalha) a bandeira de Mitra pela do cristianismo, terminou por tirar a religião dos nazarenos da clandestinidade. Tempos depois, o cristianismo torna-se religião oficial do Império Romano. E Teodósio, em 391, vai mais além, ao proibir os cultos pagãos. 



Estaria lançada, assim, uma plataforma para consolidação da Igreja e de seus valores morais. Valores esses que incorporariam muito da cultura pagã (numa espécie de "sincretismo moral").

Por isso, não seria prudente falarmos em "cristianismo puro". Nem tampouco generalizar o comportamento sexual dos romanos, como é de costume. Em síntese, como já dissemos: Roma não era um templo de prazer sensuais e luxúria sem nenhuma interdição ou tabus.


O que não afasta a possibilidade de apontarmos diferenciações importantes entre o cristianismo e o paganismo, do ponto de vista de moral sexual. Pois essas existiam e eram às vezes bem evidentes.

Fig. Cena do seriado Spartacus: sensualidade, nudez e luxúria. Contraste com a austeridade dos cristãos.

Ora, enquanto no círculo dos seguidores de Jesus Cristo haveria uma forte tendência a um controle restritivo do prazer e das sensações relacionadas à carne, bem como o medo com relação à nudez, a renúncia sexual completa para alguns (antecipação do celibato) e uma “severa desaprovação de um segundo casamento.

Entre os cultos pagãos, estaria o conhecido e prestigiado culto a Baco (dioniso), deus do prazer e da sociabilidade. A imagem desse deus se difundiria tanto no império romano dos primeiros séculos que chegaria a superar a de Vênus, deusa do amor e da beleza. O deus das ménades (das bacantes, por isso, o termo bacanal), quase sempre apareceria em meio à embriaguez e com suas adoradoras pouco vestidas e em êxtase (Veyne).


Mas pensemos, mais precisamente, nos primeiros cristãos, reunidos em pequenos grupos nas cidades sob o jugo romano. Uma seita menor no meio do judaísmo, na tentativa de engendrar um processo de construção de sua identidade moral diferenciada.

A teóloga Uta Ranke fala-nos, ainda, do ensinamento de Jesus no sentido de revogar o privilégio do conceito masculino de adultério e de poligamia, uma tentativa de abalar as estruturas pétreas do padrão de dupla-moral. (Dupla-moral: uma moral para os homens e outra para as mulheres, algo parece ainda observável nos nossos tempos).

De fato, a intenção dos cristãos seria assegurar uma diferença importante em relação aos pagãos, e tentariam isso provavelmente através de uma excepcional disciplina sexual.

Talvez por isso, o entusiasmo moral das comunidades urbanas cristãs e sua vontade em diferenciar-se, tornarem-se mais distintas e coesas em relação ao mundo pagão. Tudo isso se intensificaria com a crença em uma espécie de “fiscalização sagrada”, isto é, um «olhar penetrante de Deus a devassar os recantos da alcova».

Por outro lado, nesse processo de constituição das comunidades primitivas, a vertente feminina seria pouco a pouco sufocada, isso tanto na teologia, como na doutrina e na autoridade da igreja. Maria (a mãe de Jesus) e Madalena, por exemplo, seriam quase “silenciadas” nos Evangelhos Canônicos.

E se estabeleceria a autoridade de São Pedro, trazendo a mensagem cristã para o domínio quase exclusivo do Pater (Suely Almeida). Isso, ao nosso ver, em discordância aos ensinamentos de Cristo.


No fundo, um formato de pensamento no qual facilmente poderíamos detectar uma negatividade exaustiva com relação ao prazer sexual e o enfraquecimento do lado feminino nos nazarenos.

Somemos a tudo isso a crença na Parusia. Expliquemos melhor: segundo a filósofa Marilena Chauí, entre os fundamentos dessa antipatia à sexualidade, estaria a crença de que a morte e a ressurreição de Cristo eram sinais de um iminente juízo final. Ocasião em que a imortalidade seria reconquistada. Obviamente seriam dispensáveis as relações sexuais, pois não haveria mais sentido em se perpetuar a espécie humana.

Por consequência, os cristãos tenderiam mais ainda a se afastar de tudo que envolvesse a sexualidade e o sexo, mesmo que fosse para fins procriativos. É nesse sentido que Paulo exaltaria essa escatologia na Primeira Carta aos Coríntios, 7: o tempo já escasseia e os recém-casados devem se concentrar na nova fé e não nas preocupações mundanas (Drury).


Essa tendência de afastamento do prazer (de aversão à carne) ficaria cada vez mais evidente com a influência crescente do gnosticismo e dos neoplatônicos 

Os gnósticos (profundamente pessimista com a vida na terra) pregariam «a abstinência do casamento, da carne e do vinho»; e sobre o corpo, diriam: «um túmulo que carregaríamos conosco».


Invadiriam o pensamento cristão com uma radicalização contra a corporeidade e a matéria num nível muito além do pessimismo sexual dos primeiros nazarenos (Ranke). O corpo passaria a se distinguir (e diferenciar muito) do espírito.

Mas não esqueçamos que o rabinato pregava, segundo nos ensina Peter Brown, «o casamento como critério obrigatório de sabedoria», distanciando-se, assim, dessa aversão ao corpo e de sua sexualidade. Muitos veem ai um indício especulativo sobre a possibilidade de um Jesus casado (no caso, com Maria Madalena).

No entanto, «os dirigentes das comunidades cristãs nos séculos I e II, se orientariam em sentido diametralmente oposto» – um sinal, inclusive, de dominação especificamente masculina.

Nesse sentido, a supressão da sexualidade (uma espécie de antecipação do celibato, que se tornou disciplina obrigatória para os sacerdotes, na Igreja Latina, a partir do século XI), significaria um estado de disponibilidade decidida em relação a Deus, para eles: uma espécie de estado ideal.

Essa tendência anti-sexual e anticonjugal, associada a uma hostilidade flagrante ao prazer, levou alguns homens, como forma de se apresentar como modelo de vida cristã, a buscarem a castração física (Ranke).


Orígenes, o mais importante teólogo da Igreja grega, teria se castrado aos dezoito anos. E essas castrações voluntárias teriam chegado ao ponto, que o Imperador Adriano, no século II, decretaria a proibição da inusitada prática (Ranke).

Nessa linha, segundo Jean Delumeau, vários Padres da Igreja ao retomar uma longa tradição neoplatônica, perceberiam a união carnal como responsável por rebaixar o homem à condição de animal. Mais ainda: criariam uma vinculação, entre o sexo e a morte.

Fig. Para Neret, Gustav Klimt, ao pintar Judith I (a heroína biblica), tenta demonstrar essa associação sexualidade e morte (Eros e Tânatos).

São Gregório de Niza (330-395 d. C) escreveria: «A procriação é muito mais um princípio de morte do que de vida para os homens, pois a corruptibilidade começa com a geração. Aqueles que com ela romperam, fixaram para si mesmo, pela virgindade um limite para morte. (Apud Chauí)».

Toda essa degradação da sexualidade teria, então, contribuído para a "ascensão da dominação do homem celibatário na Igreja cristã", especialmente com a consolidação da igreja como instituição, a partir do século III. (Peter Brown).

Mas vale dizermos, esse celibato, em sua maioria ligada a uma abstinência sexual dos cônjuges, apresentaria uma peculiaridade curiosa: não se tratava de uma renúncia excessivamente impressionante.

Os homens da Antiguidade consideram a energia sexual como uma substância volátil, rapidamente esgotada nos calores da juventude. Além disso, morriam muitas mulheres. As duas realidades asseguravam "uma reserva permanente de viúvos sérios, disponíveis desde o início da idade madura e livres para se entregar às alegrias mais públicas do cargo clerical".

Enfim, todo esse processo de aversão à carne, típica dos padres da igreja, teria tornado o casal cristão "permeável, ao menos em teoria, às sombrias e graves ideias sobre sexualidade elaboradas por Santo Agostinho" com consequências importantes para os séculos vindouros (Ranke).


Mas a situação ficaria ainda mais radical com relação ao prazer e a sexualidade. Isso de daria com o surgimento de um movimento religioso chamado de monasticismo. Um acontecimento importante para a consolidação da moral cristã dos primeiros séculos.

Esses homens «ávidos de perfeição total» se retiravam para o deserto no intuito de vivenciar sua doutrina purista e se afastar do “mundo”, lugar de perdições e distante dos preceitos de Deus, segundo sua visão religiosa.

Continuaremos... (com os monges do deserto e Santo Agostinho)

Obras que serviram de referência: O pecado e o medo no Ocidente, Jean Delumeau; Santo Agostinho, Peter Brown; A história da Vida de Privada, volumes I e II, Paul Veyne; A negação do feminino, Suely Almeida; A história das Mulheres na Antiguidade, Odon Vallet; Eunuco pelo Reino de Deus, Uta Ranke; e outros


segunda-feira, 5 de abril de 2010

A "mulher pós-moderna", a moral sexual e os mitos contemporâneos



Os tempos atuais trazem à tona uma boa discussão em torno do que é a “mulher pós-moderna” e quais são os seus valores (ou novos valores) em termos de moral sexual.

Primeiro é importante que se diga: uma das principais revoluções do século XX, em especial, na sua segunda metade, foi a mudança nos papéis sociais da mulher (um processo ainda em andamento no século XXI), segundo bem nos ensina o historiador britânico Eric Hobsbawm.
E nesse efervescente processo cultural se pode observar um vigoroso (re)nascimento do culto ao prazer e uma valorização excessiva do corpo e sua erotização (o “hedonismo contemporâneo”). Era como se voltássemos "todas" as nossas atenções para o "viver na pele a vida”, com todas as suas oportunidades. Inclusive sexuais.

Falamos em (re)nascimento, pois “cultuar o corpo” não é uma inovação de nossos tempos. Os gregos, na Antiguidade, também cultuavam ao seu modo o “corpo” e o “belo”. Da mesma maneira, a sensualidade erótica foi também marcante em vários momentos de nossa história ocidental.
Na Atenas Clássica, nos debates filosóficos, o belo, o corpo e o amor eram temas recorrentes. O banquete de Platão fala bem desses aspectos na Antiguidade.

Na Roma renascentista, por exemplo, segundo G. Chastenet, na época dos Bórgias, a “cidade santa” foi palco de famosas orgias sexuais patrocinados, inclusive, pelo Papa Alexandre VI (O Papa Bórgias). Notem que a Igreja (com o Concílio de Trento) tentou combater esses “excessos“ morais do clero e criou um rigoroso código moral para o catolicismo.

Pois bem. É em meio a toda essa "hedonização" massificada, que vivenciamos a recriação, em imagem e valores, dessa “nova mulher”. Uma “nova Eva” poderíamos dizer. Mas uma Eva que não aceita mais a alcunha depreciativa de “pecaminosa”. Por isso, bem mais liberta, e sem tanta culpa (sexual) a lhe atormentar. Talvez até uma “Eva” com traços da lendária Lilith.
Expliquemos melhor: Lilith, segundo antigas tradições orais judaicas, teria sido a primeira mulher de Adão (antes de Eva). Mas por ter exigido “direitos” iguais a Adão (inclusive, copular por cima), se rebelou e abandonou o Paraíso. Deus enviou anjos para trazê-la de volta, mas Lilith negou-se atender o “pedido” divino. Mais tarde, a tradição cristã a transformou em demônio (Sucubus), especialmente na Idade Média. Nas décadas de 60 e 70 torna-se símbolo dos movimentos feministas. A iconografia de Lilith (A lua Negra) está associada aos cabelos longos, à noite, à natureza insubmissa .
Notem, por outro lado, que a pós-modernidade é mensageira de uma imensa valorização do sentir (do toque, do contato carnal, do viver o momento, da “comunhão de afetos”).

No fundo, seus valores estão embebidos com o vinho de Dionisio, por isso toda sua emotividade e aproximação com o "Eros carnal". Obviamente, em detrimento ao "refletir", característico da Era Moderna e do deus grego Apolo (que é quase sempre associado ao pensar reflexivo, ao guardar-se, à contenção do prazer, ao equilíbrio).

Vejam que ao falarmos, sob uma forma simbólica (usando os mitos), estamos tentando demonstrar fortes sentimentos e sensações, presentes nas nossas mentes e no "inconsciente coletivo", que, no passado, foram divinizados.

E que têm uma profunda ligação com a moral sexual feminina dos nossos dias (que também "diviniza" suas crenças, valores e cria seus mitos).

 
Fig - As ninfas dominam o Sátyro (símbolo da sexualidade) e usam-no à vontade. Uma boa metáfora para expressar a liberdade sexual conquista pelas mulheres na pós-modernidade.
Fig - O próprio deus Dionisio (Baco) apresenta traços masculinos e femininos. E é símbolo da antítese: emoção versus contenção (razão). Ora, pensar em termos dessa "onda do sentir", também é perceber uma profusão de imagens e cores que inundam o nosso cotidiano (os shoppings centers são bons exemplos disso).
As "imagens" parecem avançar sobre o nosso corpo (interferindo inclusive em nosso discernimento), tomando-nos de assalto.
E essa "multicoloração" parece estar "ligada diretamente às simbologias femininas, à valorização positiva da mulher, às constelações noturnas, da natureza e da fecundidade”. Como defende com maestria o francês G. Durand (um dos pais da Teoria do Imaginário. E isso nos interessa muito.

 
Era como se o véu de Isis e de Mâyâ começassem a cobrir a sociedade ocidental, numa espécie de “feminização do ocidente”. (Uma amiga, Érica, disse-me essa semana: os brinquedos, que se dizia antigamente "para meninos", estão de "feminizando", preste atenção! - combinamos escrever juntos sobre isso).
Ísis cobrindo Osiris com seu Manto (Véu). Ísis concebeu Hórus (consciência) sem relação sexual.
Mas, centremos agora nossos olhares à questão da moral sexual, pois precisamos falar do "relativismo moral" .

Ora, nesse mundo em gestação cultural, parece haver tendência ao fortalecimento do “relativismo moral”. Um fenômeno que parece se consolidar cada vez mais na cultura ocidental e que sinaliza para uma flexibilização (ou relaxamento) da moral e dos costumes, em particular, os relacionados à sexualidade.


Nele, se consagra uma “ética sexual” contextualizada, ou seja, para cada grupo (ou tribos) haveria uma ética ou moral própria ou próprias - não necessariamente concordantes entre si.

Em resumo: o que é “imoral” ou “errado” para certo grupo, pode não ser para outro (estamos aqui aproximando os conceitos de “ética” e “moral” para simplificar).

Em textos anteriores falamos desse relativismo no tocante à “infidelidade feminina”, ou seja, no grupo das "católicas carismáticas" a "fidelidade sexual ao parceiro" era considerado algo fundamental. Já para o outro grupo pesquisado, ou seja, de "mulheres afastadas do catocilismo oficial", a situação era bem diferente, se relativizava para quase metade das entrevistadas.

Quando falamos em “grupos” necessariamente nos deslocamos para tentar compreender o que seria as chamadas “tribos pós-modernas”, ou seja, as tribos urbanas que povoam as nossas grandes cidades.
Maffesoli chama-as de "legiões" nas quais há um “denominador comum” que é a “participação mágica num gosto específico”, ou seja, juntam-se segundo sentimentos às vezes não identificáveis objetivamente, pois relacionados a afetos, à sensações mais difícies de se apontar a um simples olhar.
E isso é bem comum em algumas seitas, em grupos esportivos, entre os “Emo”, "os metaleiros", os "góticos", as associações, as turmas de esportes radicais, os naturistas, etc. Todos, inclusive, com a participação muito intensa das mulheres .


Notem que esse fenômeno tem estreito relacionamento com uma período de nossa história que é herdeiro de um processo no qual os grandes sistemas políticos e ideológicos, os quais prometiam (e profetizaram) uma sociedade perfeita, fracassaram (pelo menos parcialmente). Sistemas os quais se estabeleciam o que o indivíduo "deveria ser" ou fazer para ser bem sucedido, a partir de uma espécie de magistério moral, como o "códice de Moisés".

Numa perspectiva se se alcançar "no futuro" a felicidade e o bem-estar coletivo: algo que não aconteceu.

Talvez por isso, tais promessas irrealizadas, com todas as suas “verdade universais” inerentes, caíram meio no vazio, especialmente depois das duas Grandes Guerras Mundiais. Por consequencia, a razão, o logos ("perfeito") perdeu um pouco de seu cédito e começou a ceder espaço para o Eros (símbolo também do imperfeito, do desequilíbrio). Lembrem-se que, na mitologia grega (no Banquete), Eros é filho de Pínia (a pobreza).

E mais: a filosofia e a ciência política (todas duas entoando o hino de louvor à razão) idealizaram um mundo maravilhoso que o nazismo transformou em um verdadeiro inferno na terra. Óbvio que esse fracasso de se construir um paraíso terrestre (ou uma “Cidade de Deus” como Santo Agostinho sonhou) trouxe implicações importantes no campo da moral sexual. Pois os códigos morais consagrados perderiam sua natureza inquestionável.
Com isso, se "relativizaria" a moral.

Mas, por outro lado, também é verdade que a sexualidade (no seu sentido restrito) às vezes parece está se transformando num produto de supermercado. Usam-se, experimentam-se, ou trocam-se relacionamentos sexuais e afetivos como se fossem produtos de consumo, escolhidos numa prateleira. Continuaremos nos próximos textos, para tratar da superficialidade das relações e mais particularmente para falar da doutrina moral católica...

Referências: O tempo das tribos, M. Maffesoli, A parte do diabo, M. Maffesoli; A fé do Sapateiro, Gibert Durand, A história da sexualidade, Michel Foucault, Lucrécia Bórgias, Geneviève Chastenet.