quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

A intolerância religiosa e a 19ª Semana da Nova Consciência


A 19ª Semana da Nova Consciência em Campina Grande (PB) foi uma experiência dual, mas positiva. O evento mostrou força numa conjuntura muito adversa!
Primeiro, os destaques da semana:

Merecem lembrança aqui as palestras e debates sobre a nova gastronomia (com Adriana Lucena, do Movimento Slow Food, RN) e sobre direitos humanos e religiões. Neste tema, aliás, as participações da United Religions Iniciative - URI e do Centro de Referência de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos para a Diversidade Religiosa (CRDHDR) foram muito legais.

O Elianildo Nascimento, de Brasília, fez uma palestra importante sobre a nova política nacional para o setor. Percebi ali, aliás, que a área de Ciências das Religiões ainda não se engajou neste debate.

Já para o nosso Imaginário durandiano, tive a grata satisfação de reencontrar o colega Ricardo Mário Gonçalves, monge budista do Higashi Hoganji Temple, profesor da USP e referência na área. Pude informá-lo da inserção do Imaginário, por nossa influência, nos cursos de Ciências das Religiões na Paraíba. Ele sabe da nossa atuação aqui desde a fundação de tais estudos no Estado em 1992 por mim com as presenças então de Jacques Pierre (do Canadá) e de Danielle Pitta.

O outro lado da moeda foi a verdadeira guerra religiosa promovida por alguns setores cristãos exacerbados contra o tradicional evento da Nova Consciência. Presenciei, por exemplo, ao lado de Dom José Maria Pires, da sacada do Sesc, a carreata desaforada que tais grupos - majoritariamente evangélicos - fizeram no domingo de manhã com muito barulho e palavras grosseiras....

A Inquisição passou, mas o cheiro da fumaça ficou no ar!


Para as temáticas que citei, sugiro que visitem os seguintes sites:
www.novaconsciencia.com.br
www.uri.org/americalatina
www.urialc.org
Um abraço!

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Mitologias e religiões arcaicas em Avatar

Uma das grandes atrações cinematográficas de 2010, Avatar, fez vibrar os cinemas com suas imagens espetaculares e efeitos especiais dignos das maravilhas tecnológicas dos nossos dias (o uso inovador do motion capture é um bom exemplo disso).

Porém, muito mais do que inundar a platéia com uma boa inflação de imagens (formando uma espécie de natureza encantada), o filme nos permite viajar por outros mundos do imaginário coletivo. E estamos a falar de mundos antigos, a despeito de avatar ser um filme de ficção científica.

Trataremos, então, nessa brevíssima conversa, dessa riqueza mítica (ou de uma re-mitificação ensejada pelo filme).
Em particular, direcionaremos nosso olhar à profusão de símbolos e ritos religiosos presentes nessa produção cinematográfica.

Mas antes de iniciar a conversa, proporemos uma reflexão, como que antecipando um pouco o debate, tal seja:

Será que filmes como
Avatar, Matrix, O ladrão de raios, Eclipse (e todos os outros relacionados a essa onda de vampirismo), Harry Porter, Senhor dos anéis, Nárnia não seriam sinalizações midiáticas desse processo de reencantamento e orientalização pelo qual passamos no ocidente nos tempos atuais. Sobre o reencantamento e a orientalização do ocidente, abordaremos os dois temas em textos futuros.

Pois bem. Entremos em nossa discussão:

Primeiro, é bom não se esquecer que o termo Avatar nos remonta ao hinduísmo. Para seus seguidores, avatares significam encarnações divinas de Vishnu (um entre os milhares de deuses e deusas da mitologia hinduísta), os quais surgem em períodos difíceis da humanidade para apaziguar o sofrimento e lançar novas luzes no mundo.

Num sentido mais amplo, Jesus Cristo pode ser considerado um avatar, ou seja, uma encarnação divina, no caso de Javé, segundo o cristianismo. Ressalvemos que não estamos discutindo a questão teológica da trindade ou a legitimidade de sua crença.

No filme, todavia, avatar designa uma espécie de “encarnação” do homem (uma “projeção de sua consciência”) num ser híbrido (feito a partir do genoma dos humanos e do povo nativo de Pandora, os na´vi); notem que no filme os homens "vieram" do "céu".

Já com relação ao nome Pandora, como no filme, nos parece apropriado tratá-lo no sentido de “esperança”(Pandora é um modelo harmonioso de convivência com a natureza), que coincide com um dos significados para Pandora decorrentes da mitologia grega. Para os gregos, ela seria a primeira mulher criada por Zeus e que fora dada como presente a Prometeu (responsável por roubar o fogo do céus e dar aos homens).

Essa última leitura do mito, bem disseminada no Ocidente, é realizada segundo uma concepção mais androcêntrica (centrada no homem) e patriarcal, por isso, Pandora, nessa visão, é responsabilizada por espalhar os males pela terra (a famosa caixa de pandora).

Uma visão anti-feminista que aproxima Pandora à Eva (a primeira mulher nos textos bíblicos) ou à Lilith (a primeira mulher de acordo com textos das antigas tradições orais judaicas), causando uma depreciação mítica às imagens relacionadas às mulheres (Ainda hoje, infelizmente, se faz uma leitura do Gênesis de modo a "culpar" a mulher por ceder à primeira tentação).

Por isso, adotamos aqui a leitura da esperança, pois, no fundo, ao nosso ver, é essa a sinalização que nos dá a Pandora do filme. Um lua do planeta Polyphemus, localizada no sistema de Alfa Centauro, que funciona como uma espécie de modelo de respeito à natureza e adaptação ao meio-ambiente (um Éden ecológico, espécie de reino celestial, como Zion - a Terra Prometida - o foi no filme Matrix).


Detalhe: a atmosfera pandoriana é tóxica aos humanos, por isso foi desenvolvido o Projeto Avatar. Talvez seja uma metáfora para criticar a nossa relação com a natureza, ou seja, nossa civilização não teria condições de "respirar" o ar pandoriano, por não comungar com a mesma visão cósmica.


Percebam que estamos discutindo menos o texto do filme do que sua constelação de imagens, tentando com isso decifrá-las segundo um olhar da teoria do imaginário e a partir de seu universo simbólico.

Não podemos, entretanto, deixar de enfatizar a denúncia que o filme faz da incomensurável ganância da humanidade (simbolizada pelo capitalismo americano) em se apossar de um minério, o unobtainium para salvar a terra de uma crise energética, mesmo que para isso seja destrua a natureza pandoriana (tal qual fazemos hoje em nosso planeta).


Isso é uma faceta interessante do filme (de uma importância relevante, diga-se de passagem), pois, ao nosso ver, massifica cada vez mais a preocupação ecológica, o que é fundamental.

Mas voltemos aos símbolos. A primeira imagem que nos deteremos é a da grande árvore (um arquétipo de mãe, usando uma linguagem jungiana). É muito comum, em culturas e mitos antigos, associar o simbolismo da árvore à mãe; pois, é ela quem dá os frutos.

Ora, em avatar há toda uma valorização da árvore-mãe, tanto que ela é o alvo principal do ataque dos sky men (nós, humanos, claro). Vejam a relação estreita entre a grande árvore e a mãe natureza (ou Gaia). A árvore é o próprio símbolo da vida coletiva do povo na´vi, ou seja, todos estão ligados a um centro comum.

Na cultura ocidental, por exemplo, a árvore é sinônima de vida e de salvação. O salvador (Jesus Cristo) é a "árvore da vida". Na "França revolucionária de 1789", por exemplo, "se ergueram árvores para festejar a liberdade ("árvores de maio")", uma espécie de endeusamento laico da árvore.

Do mesmo modo, no paraíso terrestre, estão as árvores do bem e do mal e a árvore da vida. “Os egípcios procuravam a árvore na qual os deuses reinam”. A árvore, em todas as culturas, tem significados muito parecida. O carvalho, por exemplo, é a árvore preferida de Zeus (alguns dizem por sua capacidade de atrair raios).

Notem, por outra perspectiva, que o mundo pandoriano mais se aproxima da religião das grandes deusas ou de uma sociedade matriarcal. Tanto a mãe, Mo’at, a matriarca dos na’vi, como a filha, Neytiri, caçadora destemida e bela (com algumas semelhanças com Diana, deusa da caça na mitologia grega) são figuras de destaque no grupo.

E mais: não percebemos, no filme, uma hierarquia masculina se impondo ao povo na’vi. Mo'at inclusive é a xamã do clã. Os na'vi veneram uma deusa chamada Eywa.

Para muitos estudiosos, num passado imemorial, antes da ascensão das religiões patriarcais de origem abraâmica, como o judaísmo, o cristianismo e o islamismo - religiões que se baseiam mais em figuras e princípios masculinos dominantes (Deus, sacerdotes, teólogos, profetas) - teriam existido sociedades matriarcais (o centro na mãe) onde se cultuava deusas femininas (as imagens religiosas mais antigas descobertas são de deusas femininas; a venus de willendorf é uma referência).

Mas outras simbologias emanam de Avatar:

A visão holista do cosmo, representada pelo endeusamento da natureza (panteismo). Era como se tudo fosse sagrado para o povo na’vi, desde os vegetais, os animais, eles próprios, todos interligados por um laço divino. O conjunto formando um organismo vivo e harmônico.


E isso parece ser um dado sintomático para o nosso viver, pois ao se redescobrir as virtudes da natureza-mãe, como nos ensina Maffesoli, era como se o sentido da globalidade se recuperasse, ou seja, abalam-se os tentáculos do individualismo moderno em prol de um projeto do todo (principalmente um projeto de cunho ecológico).

Notem que Jake (que substituiu seu irmão gêmeo falecido), ao final, morre e reencarna definitivamente num corpo do avatar, como Neo, renasceu em matrix, ou Mitra segundo o mitraísmo. No fundo, mortes, renascimentos ou reeencarnações são eventos presentes em muitas religiões.

Há ainda de se abordar a forma de sepultamento do povo na’vi, em posição fetal (retorno ao ventre materno). Grande parte das civilizações primitivas costumava enterrar seus mortos na posição fetal. “Ele está nascendo para uma outra vida, de modo que vamos colocá-lo na mesma posição que veio para este mundo”, diziam. Vários povos indígenas do Brasil, dos Andes, da Polinésia, e de tribos australiana também adotavam esse costume.

Outro evento significativo de Avatar (para a nossa análise), é quando Jake doma o grande Ogro (dragão), o rei dos predadores dos ares, de nome Toruk (na'vi). Um ser reverenciado como totem, ao simbolizar o medo e o respeito (com alguma aproximação ao totemismo encontrado nas tribos primitivas australianas).

Notem que domada, a ferocidade maior da natureza (ou a sombra de cada um de nós) tranforma-se em aliada, ou seja, o que era a força temida e sombria, "incorporada" ao herói (por um feito heroico), passa a constituir-se uma arma de proporções avassaladoras.

E "serve", a partir de então, como elemento de união dos clãs. A saga do herói une os grupos para enfrentar um mal maior (algo bem presente em nossas lendas, contos e mitos ).

A ligação entre o povo na'vi e o cavalo (um cavalo de seis patas de nome Direhorse), com uma espécie de crina que se une ao cabelo dos na'vi, formando um conjunto a partir de uma conexão cerebral. O homem (ou a mulher) e o cavalo em plena harmonia nos lembra à figura do centauro. Para a mitologia grega, um animal fabuloso, o qual habitava "as planícies da Arcádia e da Tessália".

Essa ligação se repete como os banshee, animais alados nativos de Pandora. Os banshee fazem parte de um rito de passagem dos pretendentes a guerreiros no povo na’vi. Sua montaria é uma das tarefas mais árduas e perigosas, por isso, o prestígio exaltado de que o doma para o clã. Nesse caso, tanto os ritos de iniciação, como a perspectiva (ou o sonho) de voar e o domínio da natureza, do instinto (o banshee) são elementos fartamente presentes nas mais diversas culturas.


São muitos outros símbolos que ainda poderíamos apresentar e discutir....Mas voltemos a nossa indagação primeira: qual a relação existente entre essas re-mitificações, o encantamento do mundo (ou o retorno do sagrado) e a "recuperação do natural", do naturalismo (bem evidente na comunhão ecológica das pessoas em torno e pela defesa do nosso planeta)? Todos, nos parecem, eventos dos tempos pós-modernos.

Fontes: Estruturas antropológicas do imaginário, Tempo das tribos, Tratado da histórias das religiões e outros

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

O tempo das tribos: as missas show, as raves, as torcidas e os shows de rock.




Show do U2 em Milão, 2009.


É possível se falar na existência de alguma relação entre as missas show, as raves e as festas das torcidas? Ou entre uma procissão religiosa e os passeios aos shopping centers?



Essa nos parece ser uma discussão interessante a ser aprofundada. Mas, por enquanto, iremos apenas iniciá-la.


Pois bem. Ao imaginarmos sentimentos caros ao mundo religioso que poderiam ser detectados em grupos e ajuntamentos aparentemente distantes do sagrado, o filósofo contemporâneo Michel Maffesoli é uma referência obrigatória.

Para o filósofo francês, na pós-modernidade, há uma estruturação social a partir da expressão dos sentimentos e das paixões que se manifestam nos diversos encontros cotidianos, tais como as raves, as festas techno, missas shows, ajuntamentos futebolísticos e as procissões dominicais aos centros comerciais.



Tudo isso alavancado pela tecnologia (as redes virtuais, e-mail, orkut etc) e por grandes eventos midiáticos.

Ora, no passado, o passeio principal das famílias, aos domingos, era aos templos religiosos (missas, cultos, etc). Talvez, por isso, Saramago chamou os shopping centers atuais de "templos pós-modernos". Um espaço onde se materializa perfeitamente o endeusamento do consumo (símbolo de nosso tempo) e a interação de muitos grupos, de uma forma meio difusa e diversificada.

Observem, por exemplo, num domingo à tarde o que acontece em frente a um shopping center: há uma espécie de procissão adentrando naquele espaço urbano, como outrora se fazia em relação às Igrejas (isso é uma mudança cultural importante, nos parece).

Outra questão interessante é percebermos, nos "encontros religiosos de massa", a intensa emotividade que reina nesses eventos, quase uma catarse grupal (falando-se numa linguagem psicanalítica).


Um "êxtase coletivo" numa intensidade que ultrapassa em muito a razão simples e a possibilidade de se tentar entendê-la de forma estritamente racional, ou mesmo de categorizá-la aos moldes convencionais. Por isso, para nossa discussão, importa olharmos para a força de coesão se realizando nesses "transes pós-modernos" (é algo mágico e diz muito da nossa cultura atual).


 
Claro, estamos falando de uma espécie de energia emotiva que congrega a massa, unindo-as, segundo um desejo de formar uma comunidade (de afetos e emoções mesmo que passageiras). Como é bom vibrar juntos num estádio de futebol, ou dançar em grupo numa rave ou reverenciar com a massa um cantor ou conjunto musical de nossa preferência. O mesmo diríamos de uma missa show...

Não estamos discutindo o fenômeno religioso em si, suas motivações e efeitos para cada um dos fiéis (isso é um ponto fundamental). É como se a distinção entre os eventos, na superfície, no concreto, se diluisse. Olhar para o fenômeno vida vivida pelo que acontece e não a partir de suposições e filosofias moralistas (do dever ser).


A ideia é tentar intuir um "sentimento de coletividade" (de "pertencer com os outros") em meio a esse tipo de efervescência grupal (musical, religiosa, futebolística), e todo um "vitalismo" dele emanado. Um "pertencer ao grupo" o qual sugere uma "saturação do indivíduo e do individualismo moderno".

Talvez a angústia do ficar só (inundado de um individualismo moderno) esteja estimulando essas aproximações em grupos, em tribos....

Nos interessa, portanto, tentar captar sensações de intensa emotividade em aglomerados profanos e sagrados. Por isso, talvez nem caiba mais fazer uma diferenciação tão estanque entre os termos sagrado e profano.

A separação corpo/espírito, bem/mal, céu/terra, por exemplo, está cedendo lugar a um mundo mais holístico, mas integrado. Mesmo a imperfeição da parte sombria enseja-se como elemento essencial à vida individual e coletiva (ex. a sombra de dionísio cantada por Maffesoli).



Quando falamos em parte sombria estamos abordando aspectos do nosso eu (individual e coletivo) que escondemos, como algo ruim (ex. a nossa incapacidade de nos contermos frente a determinadas situações, jogar para debaixo do tapete o que não seria bem vindo num ambiente mais austero).

Exemplificativa é a nossa relação com a natureza em processo de construção nos tempos atuais. Hoje, a natureza, é-nos (ou está se tornando) sagrada. Provavelmente, assistimos a uma revalorização de antigos cultos à Gaia (a mãe terra), inclusive através dos filmes (Avatar é um exemplo). Estamos percebendo a necessidade de olharmos o mundo como um cosmo integrado, um corpo só.

Esqueçamos, pois, a máxima da era moderna: dominar a natureza e pô-la ao nosso serviço. Precisamos conviver com ela e respeitá-la acima de tudo.


 
Mas continuemos. As massas têm sim o que falar, essa perspectiva de observação é importante senão cairemos num vazio intelectual e moralista distante do que está realmente acontencendo na vida.


As aglomerações artísticas, as torcidas de futebol, os cultos religiosos de êxtase ao se expressarem em seus encontro afetivos, bem típico das tribos (por exemplo), entram, parece, em sintonia com sentimentos antigos.

Experiências primordiais, em torno de fogueiras, cultos aos deuses pagãos, cultos de fertilidade, sacrifícios, festas de colheitas.



Todos eventos que provocavão um fortalecimento do corpo social, criavam coesão no grupo, sejam entre os celtas, os astecas, os romanos, as tribos primitivas.

Durkheim faz uma referência interessante às festas de tribos australianas. Periodicamente e movidas por um instinto misterioso elas entram em estado de congregação, onde ocorrem excessos chocantes à moral. No entanto, segundo Maffesoli, é nesses momentos de efervescência que a comunidade ratifica o sentimento que tem de si mesma.


Cultos célticos

Talvez tenhamos até dificuldade de encontrarmos uma lógica pura nesse caos orgânico, isso se tentarmos entender esses eventos com um olhar puramente científico (ao modo iluminista), mas se nos deixarmos contaminar por uma visão mais ampla, mais apegada ao fato em si (ao empírico), ao que é e não ao que deveria ser; é, sim, possível compreender parte desses mecanismos de aproximação presentes nessas aglomerações.

Maffesoli nos chama atenção para esse momento, ou seja, não se trata mais de uma história que construo (a minha saga de herói), contratualmente associado a outros indivíduos racionais, mas um mito em que participo em conjunto, com as coletividades que escolho para participar.

Para ele, "apocalipse não significa necessariamente catástrofe"; e justifica: a teatralização de uma espécie de força selvagem (ou um daimon) é uma boa maneira de domesticá-lo, de proteger-se de uma violência que poderia se converter em movimentos totalitários e perigosos (ex. a formação da SS nazista).

Como, então, se falar em individualismo, quando há uma enormidade de pessoas tentando se juntar (virtualmente ou não) nas comunidades orkutinianas, por exemplo? A todo instante mais pessoas buscam destinos comunitários, grupos de interação.

Portanto, o sentimento de pertencer a grupos, sem exclusividade (neotribalismo), é, sim, uma característica importante dos nossos dias. E seus encontros nos denunciam (pelo menos assim parece) semelhanças, na rave, nas missas show, na partida de futebol ou em shows de rock.

É na busca pelo que é "emocionalmente comum a todos" que se pode especular (no bom sentido do termo): "a vida não pode ser reduzida à utilidade". Reduzida a uma ditadura do utilitarismo (ex. alguns gostam de dizer: tudo tem que ter um fim material, lógico, tem que ter alguma finalidade prática para ser de bom tom. Será ?).

Por isso, nossa compreensão nos intimida a especular sobre essas semelhanças, ou seja, "a vontade de ser em grupo", de se juntar em volta de mitos (mito não no sentido de inverdade) e seus ritos.
O pertencer (ou poder pertencer) a mais de uma tribo, a sede de viver o momento... Eventos paroxísticos da pós-modernidade, presentes num show do U2, no show de padre Fábio Melo e na festa techno.
Ref (A sombra dionisíaca, Os tempos das tribos, A república dos sentimentos, de M . Maffesoli)